Mas, chega de enrolação e vamos a matéria...
uga,
José Halley Winckler
Abelhas Nativas
Meliponários de Jandaíra do Nordeste Brasileiro
Marilda Cortopassi-Laurino & Dick Koedam A abelha jandaíra do nordeste (Melipona subnitida), quanto à estrutura de ninho é igual a todas as outras meliponas que conhecemos: mandaçaia, uruçu, guaraipo, rajada, etc, e talvez por ser originária da caatinga ou sertão, é uma abelha muito resistente e fácil de ser criada principalmente em seu ambiente natural.
Foto 1 ninho vertical de uruçú, na propriedade do senhor Francisco Chagas | Para conhecermos melhor como os meliponicultores criam essas abelhas, o professor Dick Koedam e eu, visitamos vários meliponicultores nos estados de Pernambuco, Ceará e Rio Grande do Norte, na segunda quinzena de maio de 2000, época boa porque em alguns locais, havia chuva desde dezembro. E quando a chuva chega no sertão é festa para os nordestinos, para a agricultura, a agropecuária, para as plantas nativas, as ervas “daninhas” e as abelhas. Começamos a viagem muito bem durante a comemoração do dia do Apicultor, na sede da CAPEL em Recife, com direito a palestras, feijoada, tarde de campo e cerveja de mel! Os meliponicultores dessa região criam principalmente a uruçu (Melipona scutellaris), abelha forte e típica dessa região litorânea, mas vários criam também a jandaíra. Pela primeira vez, vimos, em Paulista-PE, as caixas verticais para abelhas, com ninhos de uruçu (FOTO 1). Essas caixas tem a vantagem de serem mais parecida com os troncos que as abelhas usam na natureza. Uma desvantagem é que quando se abre a caixa vertical, as abelhas novas que não voam e que caem, precisam ser apanhadas e recolocadas no ninho. Por causa desse inconveniente, a solução parcial é a caixa com duas tampas. Para tirar o mel, só se abre a tampa onde estão os potes. Soubemos de uma jandaíra que enxameou naturalmente indo para uma dessas caixas verticais. Nesse mesmo local havia um tronco de imburana plantado com ninho de abelha dentro! |
Uma solução original observada nas visitas, foi o meliponário tipo “gaiola” (FOTO 2). Todas as caixas ficam dentro da casa e as abelhas voam para fora através das grades. Na casa há uma única porta trancada com cadeado. Esse modelo é muito útil para meliponicultores que não tem caseiro e se preocupam com os vizinhos que gostam de mel.... | Foto 2 meliponário tipo “gaiola” na propriedade do senhor Renato Barbosa. |
Foto 3 meliponário fixo com destaque especial para a proteção dos pés e para a imobilidade das prateleiras, idealizadas pelos senhores Renato Barbosa e Ricardo Cantarelli. | Outra estrutura com a mesma finalidade foi o meliponário fixo. Encaixes perfeitos entre as prateleiras não oferecem qualquer chance de deslocamento das colméias e uma corrente com cadeado evita que as prateleiras sejam abertas. Os pés da armação, além de fixados na calçada de cimento, também possuem proteção contra formigas. A sua parte inferior é envolta por cano de plástico preenchido com óleo e querosene para as formigas não subirem, enquanto na parte superior desse copo de plástico, um funil invertido impede que abelhas voantes caiam no óleo (FOTO 3). Nessa região úmida, além das formigas, as lagartixas e os forídeos são inimigos das abelhas. “Caça forídeos” externos, confeccionados com garrafas plásticas com vinagre mais água no seu interior e canecas ou panelinhas de alumínio colocadas à porta dos ninhos para protegê-los, são soluções locais contra esses inimigos. |
Na região de Taquaritinga do Norte-PE, logo após a cidade de Vertente, encontrei o meliponário mais rústico da viagem. Todos os ninhos, ainda nos troncos, estavam num cercado de arame farpado coberto com chapas de metal. Uma tampa lateral no tronco permitia, ao ser aberta, furar alguns potes e retirar o mel (FOTO 4). No caminho de Taquaritinga, visitamos em Timbaúba-PE um criador de uruçus. Merece atenção especial o método que ele usava para dividir os ninhos até há algum tempo atrás: com o auxílio de um facão afiado cortava o ninho como um bolo, em duas metades iguais e transferia somente uma das metades para a nova caixa. Disse-nos que nunca perdeu um ninho com essa técnica lógica que ele inventou. | Foto 4 meliponário rústico localizado na borda da região de caatinga em Taquaritinga, na propriedade do senhor Fernando Xavier. |
Em Passira-PE, o meliponicultor faz aumento nas caixas de abelhas só na região dos favos de cria. Ele coloca alimentador interno, rosqueando o tubo de xarope (FOTO 5), e quando divide os ninhos, tem o cuidado de colocar os favos em cima de trabiques de madeira evitando assim o contato dos favos com a umidade do chão do ninho. No meliponário de Fortaleza que visitamos, a jandaíra é criada a 13 km do centro da cidade, no fundo do quintal da casa. A idéia original observada aqui foi o modo de esconder o alimento das abelhas contra o ataque de forídeos, também comuns nessa região litorânea (FOTO 6). Na divisão da colônia, depois de transferirem os favos, o pólen e o mel, são colocados, separadamente, na colméia nova, dentro de tubos de filmes fotográficos, fechados com tampa previamente furada, sobre a qual é colocada uma lamina de cerume. Os orifícios, assim vedados, só poderão ser removidos pelas abelhas, e somente quando necessário. Se algum forídeo entrar na colméia, ele não conseguirá entrar nos tubos de filmes nessa ocasião, para botar seus ovos. O diâmetro do orifício dá passagem somente para uma abelha. Parece que as abelhas identificam esses tubos de filmes como potes porque algum tempo depois, forram-no inteiramente com cerume.
Foto 5 A alimentação artificial é feita internamente, sem abrir as colonias no meliponário do senhor Naelson de Souza. | Foto 6 Tubos de filmes fotográficos transformam-se em potes de alimento seguros contra ataque de forídeos no meliponário do senhor Lima-Verde. |
Foto 7 Meliponário desmontável, idealizado pelo senhor Paulo Menezes. | O meliponário de jandaíra de Mossoró é o que possui mais história. Muitas das suas colônias pertenceram a Monsenhor Huberto Brunning, o pioneiro na divulgação da criação da jandaíra. O meliponário é muito organizado: todas as caixas são numeradas e com ficha de acompanhamento. O meliponicultor é o único que vende mel em garrafas de vidro de 200ml devidamente etiquetada. Possui mel de jandaíra guardado desde 1984 e alguns com analise físico-química. O meliponário está situado no quintal da casa, a apenas 3km do centro da cidade e a mais ou menos 200 metros da mata nativa, a caatinga Uma solução original observada aqui foi um meliponário com três prateleiras, totalmente desmontável (FOTO 7) e que pode ser transportado no porta malas de um carro de passeio Alguns ninhos de jandaíra estavam instalados em caixas verticais. |
Ainda em Mossoró, tivemos a oportunidade de conhecer o fundador (FOTO 8) da Coleção Mossoroense, esta com mais de três mil títulos publicados, sendo mais de setecentos dedicados à seca. A publicação, em 1991, do livro “Criação da Abelha Jandaíra” do Monsenhor Hubert Brunning foi a maior dádiva para os criadores dessa abelha. Embora escrito como diário, contém muitas informações sobre como “despencava” as colônias, isto é, tirava o mel, quanto era a produção de mel nos diferentes anos, a divisão dos ninhos, as plantas que elas usavam para nidificar e visitar, a alimentação externa, a formação de novas colônias quando ocorria aglomerado de abelhas, e a sua “bronca” com as irapuás e as Apis. Deixou um relato especial, mesmo não sabendo o significado de alguns comportamentos das abelhas, mas deixou principalmente o exemplo. Terminou o livro comparando a sociedade das abelhas com a humana....... | Foto 8 O fundador da Coleção Mossoroense e esposa (Sr. Vingt-Un e América Rosado) em sua residência. As formas circulares (gastrópodes e equinodermatas) da parede tem 90 milhões de anos e são provenientes (surpresa!) da Formação Jandaíra do Rio Grande do Norte |
Foto 9 Colméias de jandaíra em galhos de cajueiros, muito próximas das dunas da praia, na propriedade do senhor Valdemir de Medeiros. | Quem olha no mapa do Brasil a distribuição da região da caatinga, verá que no Rio Grande do Norte, esse ecossistema chega até o litoral. E lá fomos nós até o litoral (Areia Branca) onde há criação da jandaíra a 100m da praia, em colméias penduradas nos cajueiros atrás das dunas (FOTO 9). O que nos surpreendeu foi que o meliponicultor não reconhece favos de cria nascente ou jovem, mas divide o ninho quando constata muitos favos dentro da colméia. Seu conselho é precioso: para o mel não fermentar, na sua retirada não pode haver contato com as mãos. Ninguém experimenta o mel dos potes quando estão sendo cortados com a faca. |
Em Macaíba, próximo de Natal, mesmo não sendo caatinga, as jandaíras sobrevivem. Especial no meliponário que visitamos eram os cortiços feitos com o próprio tronco de imburana com a casca externa retirada, com o cerne ampliado e cortada nele uma tampa em toda a extensão do comprimento (FOTO 10). Como o ninho é feito com “pau de abelha”, as abelhas naturalmente gostam. | Foto 10 Ninhos de jandaíra instalados em troncos especialmente preparados de imburana na propriedade do senhor Tertuliano Aires. |
Foto 11 Meliponário especialmente construído para abrigar centenas de colonias de jandaíra na propriedade do senhor Ezequiel Macedo. | Em pleno sertão, bem no interior do Rio Grande do Norte, no Jardim do Seridó, encontramos o criador de jandaíra com o maior número de colméias dessas abelhas. É o único meliponicultor daquela região que tem na meliponicultura a sua atividade econômica principal. Ele possui um galpão especialmente construído para apoiar as colméias (FOTO 11) e também plantou no pátio, troncos de imburana com ninhos de abelhas no seu interior. Divide os ninhos com técnica de 2:1 ou seja, duas colônias cedem parte de si para formar uma terceira (a filha). Consegue recuperar colônias muito fracas e vende o mel em litro de whisky com rótulo onde destaca a jandaíra e flores visitadas por essas abelhas para elaborar o mel. |
Esse meliponicultor adaptou caixas articuladas para facilitar a retirada do mel de tal forma que, quando realiza essa atividade, só a parte posterior (com os potes) é manuseada. A parte anterior, com os favos de cria, não sofrem qualquer deslocamento, evitando que ovos caiam no alimento larval ou fiquem presos na parede das células de cria.Expressamos nossos agradecimentos especiais aos meliponicultores que nos receberam tão bem e tornaram possível e acessível as visitas e as observações acima relatadas. Pela ordem de visita: Renato Barbosa, Alexandre Moura, Francisco Chagas e Ricardo Cantarelli, de Recife-PE e arredores. Severino da Silva Xavier de Timbaúba-PE, Fernando Xavier Bezerra de Taquaritinga do Norte-PE, Naelson Antonio de Souza de Passira-PE, Breno Freitas e Luis Wilson Lima Verde de Fortaleza-CE, Paulo Roberto Menezes de Mossoró-RN, Valdemir Fernandez de Medeiros de Areia Branca-RN, Tertuliano Aires Neto em Macaíba-RN e Ezequiel Roberto Medeiros de Macedo do Jardim do Seridó-RN.
Soubemos que existem outros meliponicultores de jandaíra em Alagoas e na Bahia, principalmente no norte deste estado. Gostaríamos de tê-los visitado também.
Quanto aos meliponicultores, todos são do sexo masculino, alguns já aposentados e que trabalham predominantemente sozinhos ou com auxílio de alguém da família como esposa ou filho. Todos reconhecem quando as colônias são fortes ou fracas e podem identificar quando as abelhas estão de tamanho maior ou menor ao longo do ano. Alguns reconhecem os machos dessas abelhas somente quando formam aglomerados nas proximidades das colônias, fato que parece estar associado com a presença de pelo menos dez ninhos fortes nas redondezas. Esses meliponicultores sabem que as jandaíras fazem ninho naturalmente nos ocos das árvores imburana, catingueira, umbuzeiro, pereiro, pau branco e cajarana.
Todos conhecem quais são as plantas boas para as abelhas e poucos plantam para as abelhas com uma única exceção. Algumas espécies de plantas citadas como sendo visitadas pelas jandaíra foram: marmeleiro, beduaga, maniçoba, jitirana amarra cachorro, jitirana peluda, jurema preta, jurema branca, feijão de boi, malva, malva roxa, mufumbo, velame, cássia chuva de ouro, caju, amor agarradinho, salsa, moringa, carnaúba, pitanga, herbanço, gudião e sabiá, esta planta, conhecida aqui no sudeste como sansão do campo.
O mel é vendido entre 30-100 reais o litro, dependendo da região e do poder aquisitivo da população local. Com exceção do mel de aroeira, que se cristaliza rapidamente, todos os méis observados eram líquidos, com teor de água variando de 25-32%.
A população do nordeste considera o mel de jandaíra como medicinal, usando-o no tratamento de doenças das vias respiratórias (ingerido ou em nebulizador), nas dores de ouvido (aquecido), em feridas e picadas de cobra (como emplastros) em ardências e inflamações de olhos (como colírio puro ou diluído) e ainda como fortificante (puro, na gemada, diluído na pinga, etc).
A alimentação artificial é recurso utilizado na época de falta de flores na natureza ou para reforçar o ninho. Mel de Apis ou xarope de água com açúcar são colocados diretamente nos potes vazios de dentro da colméia ou oferecidos em bandejas com flutuadores nas imediaçoes das colméias. A CAPEL foi a única de desenvolveu um alimentador externo padrão, em formato de “J” com bocal para a parte interna da colônia e uma garrafinha com xarope na parte externa.
Fato notável é que todos os meliponicultores que conhecemos tiveram interesse especial em divulgar seus conhecimentos sobre o manejo das abelhas nativas e dos locais onde elas ocorrem naturalmente, dados que nem sempre estão nos livros. No entanto, todos queriam saber mais sobre a vida das abelhas, pergunta difícil de responder porque lá, eles é que sabiam mais....
você acha que jandaira sobreviveria bem em Ribeirao Preto - São Paulo?
ResponderExcluirJandaíra não gosta de frio ....
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